***Baseado na letra da canção: Quando Tiver Sessenta - Rosa de Saron***
Meados de 2042. Meus olhos se
abrem lentamente com luz do sol aquecendo meu rosto. Já amanheceu, posso ver a
claridade invadindo meu quarto e iluminando os retratos antigos de minha
família na estante. Ainda é cedo, hoje é dia de pescaria! Tomo meu café, sento
na varanda de casa e leio um bom livro. Olho no relógio, a hora passou voando,
assim como minha vida... Visto meus sapatos e ando os quarteirões que separam
minha casa simples da escola do bairro. Já na portaria, de mochila nas costas e
sorriso aberto, meu mais novo tesouro me espera para nosso passeio após a aula.
Hoje levarei meu neto ao antigo asilo da cidade, atual museu. Não há mais
moradores lá, somente fotos e recordações. Os filhos aprenderam o valor do
carinho e do amor daqueles que lhes deram a vida. Não há solidão hoje em dia,
amigo, não há tristeza, nem medo de envelhecer...
Volto para casa e caminho a
encontro dos meus antigos colegas na beira do rio. Entre uma pesca e outra, lembranças
da infância preenchem a tarde de nostalgia. Quanta coisa mudou! As crianças
hoje correm pelas ruas, enquanto nós éramos reféns da violência e da maldade do
homem e víamos nossa infância passando pela janela de nossas casas, trancadas e
cercadas por medo dos bandidos. Hoje elas vivem essa inocente e saudável época
intensamente e sem medo. Não há mais violência, o diálogo e a compreensão são a
chave da paz no mundo e agora pertencem a toda a sociedade. As novas gerações
aprenderam com os erros dos homens da nossa época e, finalmente, conhecemos o
que é ter Liberdade. Aaahh a sonhada Liberdade! Tanta luta, tantas
manifestações por nossos direitos, tantas ruas preenchidas de juventude de
garra e coragem e hoje sim podemos erguer a cabeça e dizer: “Valeu a pena!”.
Não há mais jovens desiludidos por aí, todos hoje levam nossos sonhos de um
futuro melhor adiante! Passam seus dias fazendo o bem, dando abrigo, comida, cobertor
e carinho aos que precisam. Aprendem com os mais velhos, ajudam os necessitados
e, num abraço, iluminam os corações tristes ou feridos nos semáforos da cidade.
E as guerras? Meu caro, nossos netos não sabem mais o que é isso! A humanidade
aprendeu a respeitar os povos, as crenças. Cada ser tem hoje o direito de
viver, respirar o ar puro das matas e cidades que um dia matamos, beber das
águas cristalinas e abundantes que não soubemos usar, cuidar do presente que
nosso Pai nos deixou da forma que Ele queria que todos fizessem. É um mundo
perfeito, talvez. Um sonho...
Fevereiro de 2014. Acordo e, como sempre,
estou sorrindo, meus sonhos me deixam assim. Pego
minhas coisas, tiro o carro da garagem e logo estou rumo ao meu trabalho. No
semáforo, não encontro os jovens oferecendo abraços, só crianças pedindo uma
esmola, hoje andam sem destino entre os carros, o amanhã ninguém sabe... Meus
vidros fechados são reflexo do medo que assombra os reféns da violência, do desrespeito
a vida. Sim, vida, a mesma que enquanto muitos destroem, outros lutam para
tê-la de volta, ou ainda, sonham em saber o que é Vida, mas não podem nem lutar
por isso...
Já é tarde, e mais um dia de
trabalho acaba. Na volta, vejo gente nas calçadas, dormindo em suas camas
feitas de cobertores e asfalto. Sem um lar, uma lareira quentinha, uma comida
ou o amor de alguém. Volto para meu lar. De joelhos no chão, sozinho no meu
quarto, começo a rezar... “Obrigado Senhor pelo Seu amor, pelas pessoas que
amam estarem ao meu lado, por tudo que o Senhor me deu, obrigado por mais um
dia...”
Como pode um ser humano viver sem
amor? Posso voltar a sonhar? Por que o futuro não pode ser perfeito, como num
sonho? “Esperar” um amanhã melhor começa com “agradecer” pelo hoje. Deus nos
enche de amor a cada dia, como alguém pode não reconhecer isso e não retribuir
esse amor com um “Obrigado”? O dia que o mundo fizer isso, o sonho se torna
realidade... Será que esse dia vai chegar??
"Você continua um sonhador
Que ainda sonha que tudo mude
Quando tiver sessenta...”
O sono invade minhas orações. É
hora de descansar.
Meados de 2042...
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